Carta ridícula

(João Morgado)

 Que cada momento do teu silêncio pertence a uma lágrima minha já tu sabes.
Estamos a destruir-nos com atitudes inconsequentes, ou a deixarmo-nos destruir com o tempo, este tempo que nos leva a serenidade e nos traz em troca a falta que fazemos um ao outro. Pergunta-me pelo sorriso, que eu fui perdendo, nem sei bem onde... na força das palavras tantas vezes escritas e rescritas.
Não me sinto irritado, sinto-me inseguro. Sinto saudades de vez em quando. Quando penso que poderia ser diferente. Que cada lágrima que me dás, que me roubas, apaga mais um pouco da esperança que fui apertando cá dentro. Por isso, dá-me a tua mão e... não nos deixes morrer…por favor. E perdoa-me as lágrimas que te tenho causado. Se conseguires perdoa também os meus afastamentos, todos aqueles em que me ausentei de ti mais do que um minuto, alguns por conselho médico, outros por racionalidade, ia voltando aos poucos, só para saber de ti e soprar a nossa chama, bem sei que em algumas dessas ausências me julgaste o ser mais indigno, sei que houve maldade pelo meio nos incendiando. Disso, também sei que querias seguir alguns conselhos que te davam, “ se fossem bons não tos davam”, E hoje porque teimas nesse distanciamento? Queres encontrar razões que a razão desconheça, ou queres simplesmente pagar com a mesma moeda, aquilo que tão bem sabes não ter preço?
Sabes que sou um ser sensível, alguém cheio de defeitos, cheio de problemas, cheguei a pensar que era este ser pelo qual te enamoraras. Perdoa-me se te julguei “mal”. Andamos a ignorar os imensos sinais do destino, os doces sinais que assim nos levam até à claridade da despedida. Ou será ao rompante da chegada? Será que não queremos ver a verdade e tapamos os olhos um ao outro. Eu ainda suportaria mais uns segundos, mais uns minutos, mais umas horas... mais umas abismais demoras, mas o nosso egocentrismo, o que todos os animais possuem e uma maldita e incomensurável distância que nos separa, está a fazer com que nós nos desmoronemos nas nossas convicções, nas nossas vontades de sermos felizes.
Quero com isto que entendas que cada palavra tua, não cumprida, é para mim estranguladora, digo-te que estás a consumir a minha esperança, quando prometes vir a mim com algum gesto e não cumpres. Mais quando dizes que fechas as portas que nos permitem comunicar entre nós, como se isso fosse possível. Devias saber que não se podem fechar sentimentos numa gaiola. Quando muito atormentamos a alma e nos tornamos ácidos e mórbidos. Creio que nem te apercebes do erro que cometes, da angústia que provocas.
Um dia vais ter que te olhar no espelho e ver o que atingiste, ver o que realmente queres, ver o que és e o que vais ser, não para fazeres mil planos, ou para perdoares decisões erradas, mas sim para ganhares consciência do que tens em ti. Inclusive se poderás viver com algum espinho.
Se o amor que me declaras é autêntico, “já pensei que sim” o que vale ou não a pena, talvez nem tu saibas alguma vez e se for para te arrependeres do que não fizeste, melhor será me apontares o dedo, assim podes viver mais livre. Sabes que aqueles que eu amo, deixo livres. Não é fácil. Tu sabes que não é nada fácil, por isso reténs a ponta desta corda imaginária. Creio que vais segura-la sempre. Usando o tempo que ainda continua a ser a melhor maneira de o esquecer.
Um dia vais ser feliz, certamente feliz, porque eu quero e torço por ti, porque te deixaste envolver na decisão certa, porque corrigiste algumas banalidades e seguiste o teu rumo... e um dia vais ter coragem e vais saber dizer adeus aos teus medos, sem olhares para trás, vais ser fiel àquilo que te rege na vida. Tomara que sim. (O amor ou é incondicional ou não é amor, é antes uma miscelânea à moderna, onde cada um ama os prazeres que dai obtém).
Só queria poder pensar que tempo não nos falta e que tu apenas estás a arranjar uma maneira de seres realmente feliz. Porque eu quero ser feliz, sem saudade, sem palavras que fiquem por dizer, engasgadas na garganta com medo de serem pronunciadas, ou mal interpretadas, sem abismos que entravem algo do que de tão bonito sonhei para mim, sonhei para nós alguma vez, como o que eu já vivi desta eclética existência inspiradora e destes sonhos que montei no meu cavalo alado, este unicórnio poderosíssimo que me tem transportado para além do arco-íris, para além do arco-da-velha.
Deitado na minha cama escuto aquela música, aquela que um dia, num dia em que estavas triste comigo fizeste questão que eu ouvisse, “Bijuteria”. Estes dias teimam-me em ouvi-la. Penso se poderia ta devolver. Já que a tua presença neste momento não me adoça, ao menos fecho os olhos e imagino como seria se aqui estivesses, segurando com força as minhas mãos geladas que teimam em escrever textos e textos sem fim. Cartas amargas, cartas tristes, sonetos e mais poesias que na minha insatisfação vou rasgando, pensando que talvez assim eu me dispa deste fato escuro e triste.
Vês estes olhos mendigos, largando sais? Que vão piscando, na tentativa de antes que os enxugue escreva mais umas palavras, antes que me fiquem entaladas entre os dedos e a mente. Queria pensar que os teus olhos são as minhas mais belas pérolas e que nunca irão chorar assim. Queria pensar tão simplesmente…
Mas sabes, eu estou cansado. Tenho os olhos frágeis de tanto escrever e reescrever com eles humedecidos, assim como o meu coração de tanto te esperar. Eu não quero escrever meras linhas e que nelas apareça o teu nome. Quero sentir-te do meu lado, quero que para além da escrita, para além do desejo, viva intensamente uma história só nossa.
Porque tens medos, porque me fazes sofrer, meu amor?
Tu conheces tantas das minhas moléstias, das minhas amarguras! Sabes tão bem que não escolhemos quem amamos, mas amamos quem o amor escolhe p’ra nós e sabes que o amor te escolheu p’ra mim, eu apenas queria alguém bonito por dentro, embora ande frio nestes dias, talvez por tantos desacertos, sabes que te amo e não adianta tentar encontrar medidas para definir intensidades. Amo-te simplesmente!
Quando digo que te amo, quero dizer que haja o que houver, tens que ser feliz, nem que eu não o saiba, só que eu o imagine, já serei ditoso.
Dizia Álvaro de Campos, que todas as cartas de amor são ridículas, esta também deve ser uma carta ridícula, como tantas que te escrevo, mas não te importes, escreve tu também uma carta de amor ridícula, nem que apenas tenha uma simples palavra (às vezes complexa demais como a palavra Amo-te), mas se ma enviares, por favor pensa naquilo que dizes, cuidando que tens um coração nas mãos e que está frágil e esse coração Ama-te.

PS: Entre a poesia e a solidão,
eu rabisco o amor,
em versos de dor,
que me apertam o coração.

Entre a poesia e a solidão,
eu tenho  um sonho
harmonioso e risonho,
que o vento sopra da mão.

Entre a poesia e a solidão,
eu tenho além de mim,
um amor enorme

e trauteio como uma canção,
uma demora sem fim,
com o teu nome!