Lágrimas de sal

(João Morgado)

Que saudades do mar… Que saudades do seu sal e do bater das ondas. Saudades daqueles sons desiguais mas iguais a si mesmos, sons que açoitam e acalmam nas horas menos boas.
O mar sempre me aguçou as melhores respostas que mais necessitei, ele sempre cavaqueia comigo entre uma brisa e outra.
O mar costuma colorir os meus versos com as cores das suas ondas, autenticamos com o selo embebido no seu marejar. Careço de sentir o vai e vem das ondas enquanto recito os meus poemas, ou de trautear aquela música que a alma de poeta me obriga. Sim… Sinto-me obrigado a recriar a música do momento por imposição do feitiço que o mar exerce em mim.
O mar é indulgente para comigo, sustenta-me a alma, dá-me razoes aos sentidos para que possa sonhar.
Quantas vezes me amedronto com a sua intimação, sofro uma atracção calma e sedutora pelo seu abraço meigo e cálido, num mesclado de deleite e temor, com receio de me arruinar nas suas águas e nunca mais voltar.
Quero me aconchegar nesse murmúrio e me embrulhar no seu azul e verde e anestesiar-me nas suas águas vivas. O mar e toda a vida que o envolve, embriaga-me duma maneira tal que chego a julgar que é a força alienada da lua por tanto se reflectir nas águas á noite.
Lembro-me quando era petiz, daquelas pedrinhas que as águas deixavam mais acima do espraiar, quando as ondas fugiam delas pelo mar a dentro. Sim as águas fugiam delas, De certo porque sabiam da força que elas exerciam, Essas pedras tem muita força, acredita que têm, senão como explicar o jogo das pedrinhas e o seu efeito nas crianças, ou o lançar das pedras para prever o futuro. O futuro visto nas pedras tem mais certezas. Só pode ser pelas influência que o mar deixa nelas.
Era quase sempre ao cair da tarde, vinha o fresco nos fazer companhia, a mim e as pedrinhas, conversávamos os três enquanto esperávamos a lua, E ai jogávamos ao jogo das pedrinhas.
Tantos versos que eu lhe dediquei deitado em cima das pedrinhas, em cima das conchas e dos búzios.
Ando com ideias de em breve lhe fazer uma serenata amarga, de saudade, mas também mesclada de confiança.

Quero cantar-lhe um fado dos meus!

Olha o vento que lá vem da serra,

forte e audaz como nunca o vi.
Traz com ele o grito que encerra,
mas se amansa ao chegar aqui.

Ainda guardo aquelas conchas e pedrinha multicor que meti na algibeira da última vez que o mar me sorriu. Têm me ajudado muito na decoração dos meus sonhos.

Há muito mar em mim, nas minhas lágrimas salgadas de saudades há mar, no meu amar há mar, naquilo que sonho há mar.
O meu mar é triste por estar longe das águas de sal.

Ó mar salgado
Por mim amado
Mar de encantos
Cessa meus prantos
Meu mar bravio
Cheio de cio
Acalma essas ondas
Que por onde andas
Não mais espraias
São loucas praias
Estas que em nós
Nos teimam sós
Ó mar índigo
Meu mar abrigo
És mar castigo
Sinto-te afastado
Meu mar amado
Mar insurrecto
Meu mar dilecto
Como eu te quero
És doce e austero
Ó mar capaz
Meu mar audaz
Fantasioso
Mar perigoso
São tantos milhas
Que as maravilhas
Ficam remotas
Por extensas rotas
Ó Mar gostoso
Faz-te meu gozo
Anda dai
Sê meu sagui
Meu mar mexilhão

Ó maré chão
Solta teus ais
Salga-me o cais
Com teu frenesi
Ó mar que eu li
Meu mar, és tu
Anda dai…
Sê meu guru